Era uma menina mulher, ou uma mulher menina... dessas difíceis de se encontrar. Dona de puros desejos, de sonhos simplórios e inimagináveis... O inusitado imprevisível sempre lhe pareceu algo ideal, mas possível. Teve sempre uma vida pacata poupou seu fôlego eu acho, parecia esperar o sufoco chegar, o que lhe perturbaria a mente, o sono, o corpo e o coração. Romântica, sonhadora... boba, talvez. Sempre viveu à espera do amor acontecer, não o ‘amor’ arrebatador, selvagem, fugaz, mas o amor calmo, pleno, sublime. Em sua vida sentiu mais do que viveu. A esperança era o motivo de tanta evasão. Acreditava que mais a frente estava o tesouro que tanto procurava: o segredo da felicidade.
Sob o céu escuro coberto de estrelas viu o príncipe chegar, em seu cavalo branco vindo do interior dos seus mais fortes desejos. Os olhares se encontraram a certeza de que inesquecível tudo seria. E a entrega da confiança foi imediata, impulsiva e verdadeira, ela se sentia segura ao seu lado.
Numa velocidade luz romperam a escuridão sob o olhar atento das estrelas. E os pensamentos que não paravam de surgir, não conseguia entender o que estava acontecendo. E durante o caminho as poucas palavras proferidas serviram para manter o diálogo do que era real, enquanto ela sentia-se levitar docemente com o aroma do que parecia improvável.
Ela era uma menina cheia de medos, consequência talvez de sua criação numa redoma, mas o sorriso que secretamente sorria era o impulso do que estava a sentir, aspirava liberdade! Sentia-se a vontade para com ele fazer as coisas mais loucas.
E era festa, as luzes iluminavam o momento e o lugar. Ela bem que tentou disfarçar a timidez, mas qualquer um podia ver atrás dos sorrisos sem graça e dos olhares reflexivos o rubor de não saber explicar o que estava fazendo. Não se sentia mal, só não conseguia entender como chegara até ali, como tudo acontecera com a rapidez de uma estrela cadente. E estar ali, lhe trazia tudo o que queria, mas que não imaginara ter.
E todas as cores, risos e diversão ao seu redor faziam-na sentir-se num sonho, num mundo literalmente infantil, onde o fascínio pela fantasia e o prazer nas coisas simples era o que o regia; era o mundo com o qual sonhara, no qual gostaria de sempre viver.
Chamo-a de menina porque sua alma ainda o é. Ela sabe que precisa crescer, mas não o quer. Não se acha capaz de lidar com a ideia de que é uma mulher, simplesmente não sabe sê-la. Não consegue largar mão da espontaneidade com a qual adora viver; longe do calculismo frio, da superficialidade e das responsabilidades morais e éticas pelas quais um adulto deve tentar zelar. Às vezes se questiona, mas gosta de ser impulsiva, dizer coisas sem pensar, rir e chorar por motivo qualquer. Decidiu viver assim, leve como uma pluma. Adultos são chatos, ela adora brincar!
Parecia girar no mundo novo, não sabia o que fazer, e ao se dar conta daquele que estava ao seu lado sentiu-se feliz, e perplexa diante de tal simplicidade. Subiu ao céu, não o alcançou, mas, sentiu-se dentre as estrelas, perto da lua, envolta em pura magia... seus pés deixaram de tocar o chão. Ele a fez flutuar. Suponho que até agora ela esteja suspensa no ar.
Ela tinha muitas certezas das quais não abria mão. Achava a rapidez algo desnecessário, a exposição lhe causava aflição e voar, definitivamente estava fora de questão. Ele quebrou todas as suas regras.
E no cume de todo o encantamento, ele lhe falou de sentimentos... depressão, solidão, redenção. Não eram meras palavras, era a mais pura poesia. Recitadas lá no alto ela as ouvia, e custava a acreditar no momento que vivia.
De poucos amigos verdadeiros e confidentes, sempre contou a si própria todos os seus sentimentos. Desde criança fez do papel e do lápis seus inseparáveis companheiros, contava com eles para se contar, para confessar os seus segredos. Às vezes sente-se só, mas quando começa a escrever encontra-se consigo mesma, se faz companhia. A tríade – linguagem, música e poesia – a faz suspirar, a faz se encontrar.
A voz dele soava-lhe como música em seus ouvidos, queria encostar-se a seu peito, ouvi-lo e só se sentir flutuar, queria parar no tempo. Mas o tempo não parou, e a intenção ficou presa no olhar. Teve medo de pensar que ele era tudo o que sempre quis.
Ela nunca fora aventureira, mas tem a certeza de que não quer crescer. Vive em busca do mais e do menos possível – liberdade e responsabilidade. E qualquer pensamento contíguo a esse faz sua pupila dilatar.
Em terra, entre toques, olhares, palavras e sorrisos, não pode deixar de perceber o quanto ele a fazia bem. Sentia-se perplexa diante de tanta simplicidade, se surpreendia com tanta espontaneidade. Queria ficar ali pra sempre. A descontração entre eles acontecia naturalmente. Era como se já fossem amigos há anos. E tudo isso foi o bastante pra balançar seu coração. Nessa brincadeira de atirar, foi atingida por tanto carisma, que acabou por ser cativada por uma pessoa ímpar!
De volta à realidade, resquícios do que parecia ter sido um sonho ainda pairavam no ar. Cada instante era registrado e eternizado dentro dela, e tudo o que era dito foi gravado. Sentia-se anestesiada, inebriada com o bem estar que aquela situação proporcionava. Com o olhar ela pensava fazer saber quanta satisfação estava sentindo por tê-lo ali. É sempre agradável se deixar envolver com o que é tão adorável.
Em seus devaneios ela sempre evoca o destino, acredita mesmo naquilo que está predestinado a acontecer. Isso explicaria o que nos parece inexplicável. Ela acredita que nada do que vivemos é vão, nada é por acaso. Uma coisa sempre nos levará a ter, conhecer ou viver outra coisa.
Na hora da despedida, um beijo no rosto, um abraço apertado, felicitações de satisfação. Olhar expressivo... Ela quis se jogar em seus braços, dar vazão ao desejo, ao impulso contido, mas a incerteza da reciprocidade lhe fez hesitar. Pensou ver nos olhos dele o mesmo que transparecia no seu olhar. Um breve instante de silêncio, e um tímido até logo pôs ponto ao encontro. Observou ele se afastar rapidamente.
Misto de menina e mulher tem seus sentimentos constantemente misturados. O impulso atiça o desejo, mas o pensamento frustra-o. Até os afetos precisam ser inusitados, imprevisíveis, impensados! E os desejos, bom... os desejos pedem pra serem consumados. A mulher ainda precisa alcançar a espontaneidade da menina...
Entrou. Deitou-se. Tinha um feliz sorriso nos lábios. No silêncio pensava “Que noite...”
Uma noite de Natal feliz!

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