Ao iniciar a leitura do livro "Admirável Mundo Novo" fiquei, digamos, chocada com a forma como a vida era concebida, surpresa com a modalidade de vida adotada por esses "civilizados". Sem família, sem laços afetivos, num lema de 'Cada um é de todo mundo'... Condicionados a serem excelentes, bons ou mais ou menos, limitados a desempenhar suas funções, a tomar o 'soma' sempre que algum pensamento ou sentimento muito forte lhe viesse ao ser, enfim... Nem de longe essa vida "civilizada" me parece vida de verdade, baseada na liberdade. Tá mais para um modo de viver desapegadamente, fruto de condicionamento tão acentuado que priva as pessoas de conhecerem sua capacidade de sentir, pensar, refletir.
De fato, essa é a proposta do livro: apresentar um panorama de uma vida gerada e voltada para interesses industriais (no sentido geral da palavra), sob a pessoa divinizada do senhor Ford!
Mas o que me chama a atenção é que esse modo de vida em muito mesmo se assemelha aos dias atuais, principalmente, no que refere às ideias a respeito de religião e alienação.
Hoje em dia, vive-se uma era em que prega-se a liberdade, assim como resistência a qualquer "força" que tenda a atrofiar o pensamento e nos aprisionar a valores, princípios e/ou dogmas julgados ultrapassados. Então, eu me pergunto: o que é ser livre?
Associando certos preceitos adotados no "Mundo Novo" aos empregados na sociedade atual, pode-se observar o total desprendimento a tudo que possa reprimir nossos desejos sexuais, ou melhor, tudo que possa fazer estes dependentes de laços afetivos. Fico pensando se enxergar os outros tão somente sob o aspecto 'carnal' da coisa não é reduzir as pessoas à matéria - sem sentimentos, sem emoções. Ainda que a satisfação dos desejos nos proporcionem sensações diversificadamente incríveis! Mas e o ser? E os laços? Fico me perguntando ainda se todos que se sentem praticantes do atualizado "Ninguém é de ninguém" realmente se sentem satisfeitos com esse modo de enxergar o outro e a si mesmo, limitando a riqueza que nos compõe a simples desejos sexuais e à satisfação destes. Ouço muito se falar em liberdade ao se viver assim. Daí penso... a liberdade só pode ser relativa!
Se preciso de uma ligação afetiva para desenvolver a realização de certos desejos, sou julgada presa a isso. E o conselho que recebo é que preciso me libertar dessa necessidade, que as sensações vitais podem ir mais além, que o interessante é viver o agora! E sentir o que há pra ser sentido. Mas se alguém não pode se permitir conhecer uma pessoa enquanto ser pessoal e social, para poder desenvolver a realização de tais desejos sob o pretexto de que isso não é possível, ou "aguentável", essa pessoa também não estaria numa espécie de prisão?
Ora, se não consigo abrir mão de algo para experimentar outro, acredito que minha liberdade está em determinado ponto, comprometida. Se não consigo me desvencilhar de algo deve ser porque estou presa a ele. Sempre se está preso a alguma coisa. E isso nunca é uma escolha pessoal, mas um condicionamento do ambiente a que pertencemos. A liberdade nunca é total. Se não estou presa a uma coisa, estou a outra. E não importa quão moderno isso pareça ser.
Onde a religião entra nisso? Em algumas justificativas, visto que muitas pessoas ainda valorizam a ideia de relacionamentos sérios, casamentos, virgindade, e a relação de tudo isso com a sociedade.
Além do mais, a religião entra também como objeto de fortes críticas no que diz respeito a alienação. Ora, até mesmo com a leitura do livro "Admirável Mundo Novo", pode-se perceber que a alienação não está restrita a um segmento religioso. A alienação está em qualquer parte, em qualquer escolha. Enquanto no 'Mundo Novo', o 'soma' aliena os 'civilizados' privando-os de se inquietarem com os acontecimentos, ou de persistirem em pensamentos e/ou sentimentos contrários aos determinados pelo condicionamento; a religião aliena os selvagens com seus valores, princípios e dogmas. Valores, dogmas e princípios estes que não deixam de existir no 'Mundo Novo', mas que tão somente se apresentam sob outro interesse.
A alienação há de ser considerada como qualquer artificie que se possa usar para fugir da realidade ou da responsabilidade por esta. Posso obter alienação quando dependo de qualquer coisa que me faça esquecer, nem que seja por um instante, de onde estou. O vício, seja ele qual for, pode ser resultado de uma busca por alívio, que oferece uma sensação de desapego com o que é real. Bebidas, sexo, música, televisão, novelas, livros, e/ou todas as drogas que se possa imaginar. A alienação, primeiro é uma busca de bem-estar, e por isso é utilizada por forças maiores para manipular a massa, porque aqueles conhecem o resultado que a alienação surte, e o quanto isso pode ser vantajoso para quem viabiliza e tira disso resultados para seus interesses.
Enfim, é um simples comentário acerca de minhas percepções sobre um livro que sequer terminei de ler, mas que me fez refletir sobre aspectos tão discursivos atualmente: liberdade, alienação e religião. Faça a sua interpretação, tire suas conclusões, que eu daqui vou tentando encontrar as minhas. E encerro com uma fala muito interessante, de um pastor chamado Fabrício Cunha, "Das drogas alucinógenas, a única que uso um pouco é a religião. É alienante mas, pelo menos, não faz mal pro corpo.".
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